Wednesday, July 25, 2012


À NOITE NO MEU QUARTO

















Nada disto me agrada!... Tenho de procurar algo na imaginação que me convença.

- Que linguagem é esta?...
Será que este silêncio me conhece?...














"Claro que não!..."
- Ainda não te apercebeste?...

"De quê?..."

- As posições inverteram-se...
As tuas perguntas pertencem-me!...
Regressaremos ao princípio,
Aonde as personagens
Permutarão as situações criadas...














"Ainda não sei aonde queres chegar!..."

- Não?...
Terás de reconhecer
Que fizemos um diário.
Invertámo-lo agora!...

"Não é possível!..."

- Tudo é possível
Onde tudo é lógico!...

"Sendo assim...
E ela?..."














- Ela?...
Tornamo-la real...
E, uma vez que foi fácil encontra-la,
Conforme quis,
Aceitêmo-la, excepcionalmente, 
Sem interferências,
Como se tivesse, sempre,
Feito parte de nós.

"E o vizinho de cima?..."

- Ouvi-lo-emos pela primeira vez...

"E a mosca?..."














- A mosca?...
A mosca
É a única realidade aqui dentro...
Realidade ferida pelo som da minha voz.


(Um tema: "Time After Time" - 
- Paul Desmond Quartet with Jim Hall )

Pain-Killer

Friday, January 20, 2012


CORRIGIR O PASSADO
















Estive a ler Zaratustra mas logo o coloquei de parte. E se daí para cá voltar a lê-lo, poderei ter a sorte de concluir que o seu Super-Homem se parece com Deus.

- Estás estranho...

"Estou tenso..."

 












- Como assim?

"Não sei...
Sinto uma espécie de nó na garganta..."

 
- O que poderá ser?













  
"Ainda não sei bem...
Posso fazer-te uma pergunta?"

- Sabes bem que sim.

"O que é para ti o dia seguinte?"

- A pergunta 
Não deveria ser feita desse modo
Mas antes colocada nestes termos:
"Que coisa é essa?"














"Pois seja!"

- Tal coisa
Já faz parte do passado...
Repara: 
Há aqui um regresso!
Poder-se-á pensar que o ser-humano
Segue em frente,
Mas não!...


"Então como é?..."

- É como quem vai em volta,
Quase em círculo...
Há, sem dúvida,
Toda uma tentativa não-consciente
De aperfeiçoar o passado...



"Será?"

- Meu caro:
Outra coisa não é!...

"Corrigi-lo?..."

- Exactamente!...
Corrigi-lo...
Que outro interesse mais lógico
Poderia hever?...

 











"Compreendo..."

- Há, ainda, um pormenor
Em que nunca pensaste...

"Qual?"

- Porque razão essa coisa
A que chamam Homem se lamenta? 














(Um tema: "VERY LATE" - Ralph Towner)

Bom fim-de-semana!

Pain-Killer

Friday, November 25, 2011


A VI
AGEM (reedição)

 * a propósito de uma certa viagem no dia 25 de Novembro de 2006


"Porquê esse sorriso?..."

- Estou a recordar...

"O quê?"

- A estação de comboios.














A estação era...era naquilo ali em frente. "Naquilo, como?" Perguntou o poeta meio intrigado. Frente a isto, nada lhe disse: «o silêncio ajudá-lo-á...» pensei. Quando assim acontece, ele sabe que mais tarde encontrará a resposta. Voltando á estação, concluo uma vez mais: Sempre que deparo com uma coisa daquelas, desperta em mim uma sensação esquisita, vagarosa...lá dentro, não se tem nunca a mesma idéia. Aquilo, no seu interior é um páteo a dar acesso á mudança. Então, com um objectivo definido, entrei: havia gente chegando mais cedo para esperar. O movimento eram linhas cruzadas em várias direcções. De súbito, pensei: «E se eu não for hoje?» Esta dúvida, significava alguma coisa, com a sua linguagem cá dentro. Essa coisa sabia atraír-me ao seu jogo: o comboio era o pretexto, e eu entrava nele.















Através da janela, deixei-me olhar, tentando ir ao encontro das coisas. O fadário começara: primeiro um poste, depois o casario, tal como o comboio em direcção inversa. Havia gente parada, enquanto o pensamento andava de um lado para outro. Os pensamentos eram como folhas soltas, dispersas pelo vento. Gente parada, seguindo como as árvores para lado nenhum. Deixei-me estar, eu sabia que a Coisa já tinha dado por mim...














"A coisa!?"

Entretanto, Ela ligou-me:

«Olá, tudo bem?...
Eu já cheguei...e tu, vais demorar?»

«Sim, tudo bem...já não me sinto apavorado.
Agora estou apenas com medo...
Ainda falta um pouco, minha querida...
Mas sossega,
Vou a caminho e não tarda estaremos juntos.
Estás nervosa?...»

«Hum-Hum...» Retorquiu Ela.
«Um pouco ansiosa, talvez...mas isto passa.
Vou esperar por ti, míudo...
Um beijo...até já!»














Enquanto isso a paisagem espreitava-me de todos os lados, trazendo-me á memória a delicadeza do seu rosto, o encanto do seu corpo belo e doce que as minhas mãos tantas vezes tinham tocado em sonhos...

"Mas que Coisa era essa?"














- De momento,
Só sei que excitava...

"E depois?"

- Sabia que iria massacrar-me
Com os seus pensamentos,
Por isso
Desfrutava o mais que podia.

"Desfrutavas, como?"

- Tirar partido, o quanto antes,
Daquela janela...














"Ver cores?"

- Ver gente,
Movimento,
E sobretudo luz...
Porque pensar é horrível!
Verdadeiramente,
A minha intenção
Era servir-me da memória...














"Mais nada?"

- De momento,
Não podia fazer mais nada!
Por esta razão,
Às vezes aceito a ideia
De que não preciso pensar por mim...
Apesar disso,
Acabo normalmente por controlar-me...
É uma chatice!

"Não compreendo porque não me levaste..."

- Pois não...
Talvez, porque o ser
No ser
Não
tem contornos;
Não se mostra como imagem:
O ser
É o que é:
É o contorno da imagem
Organizando-a.














"Com quem falas?"

- Estás atento...

"Com quem falas?"

- Cala-te!...
Ele,
Na medida em que é pensado,
Deixa entrever que o Homem
É no pensar...
O pensar,
Da verdade do ser,
Que questiona
Em ser para ele
A objectividade do subjectivo...
De ser,
O ser no Homem,
Coexistindo
No próprio facto
Da forma que lhe é dado ser,
Para ser mesmo.

"Pára com isso!
Fala-me do comboio."














De repente, o mundo estacionara. Lá fora, através da janela, o desenho parecia estático, sem movimento como em certas pinturas. Fôra tudo breve paragem no apeadeiro mais próximo. A Coisa interrompera-se...mas eu sabia que ela regressaria; era somente uma questão associativa e pronto: o pensamento é uma fatalidade a coisa não pode deixar de ser.
"O que é a Coisa", perguntou o poeta. Eu poderia dizer-lhe que a Coisa, é justamente aquilo que está por detrás daquilo que não tem antes nem depois e que só a partir do momento em que for significada poderá ter isso...isto é: ser limitada — mas, ás vezes, o poeta cansa-me.













Esta idéia, nesta tentativa, tem a sua evidência: evidência essa, que vai desde o ser á relatividade infinita, na qual o pensamento brilha com a sua mágica do real, enquanto na aparência do visível, há só um gesto por classificar. Para cá disto, não está o tempo da minha percepção.

"O que está em vez disso?"

- O Não-Ser!...


















"Precisamente aí,
Ao reflectires,
Estarás uma vez mais
Contemplando para cá..."

- Contemplando tudo aquilo
Que me é anterior.
Ou porque a minha subjectividade
Não quer ficar sepultada
Em seu silêncio...
Aguardará
Que o desconhecido se mostre...
Direi melhor:
Espera pela maré.
Ou espera nascer,
Tal como naquela foto da Daniela.














Lembras-te?...

"Sim!...Essa foto é fantástica,
Plena de significado!...
Mas e o silêncio?...
Que silêncio é esse!?"

Subitamente, alguns ruídos vindos de fora acentuaram mais o ambiente do meu compartimento.

"Porque te calas?"

- Lá está!...
E se houvesse qualquer coisa
Do lado de fora!?...

"Do lado de fora!?"

- Exactamente aí!...
Sem lado de fora
As esferas
Giraram cá dentro...

"Brincas comigo!"















- Se te explicasse, não compreenderias...
Contudo,
Tentarei dar-te pelo menos
Uma aproximação:
Há pouco,
Aqueles ruídos
Libertaram-se do peso e do atrito.
Eles me fizeram vêr
Todo o comboio por fora...














"Mas tu disseste
Sem lado de fora!..."

- Por fora só eu estou,
Vê se compreendes!...

"Sim...
E mais?"

- O meu olhar, cá dentro,
Estende-se ao longo dos carris
Como se ficasse em terra firme
Ao vê-lo partir...













"É curioso!...
Como a gente se engana...
Eu achava isso
Fácil de mais
Mas a verdade é que não sei
Aonde queres chegar...
E o que tento ver é confuso...
Mas ainda há outra coisa..."

- O quê?...

"Tu próprio és confuso!"














- Não...
Quanto a isso estás enganado...
O que se passa é o seguinte:
Este meu mundo,
Ou seja:
Esta maneira de ver
É já o próprio mundo
Em percepção constante,
Onde tudo é situação confusa
Por mais pormenorizado e explícito
Que eu procure ser!...

"Talvez seja como dizes...
Mas prefiro que me fales do comboio..."

- Quanto a ele,
Só sei que em dada altura,
Tudo me era interior...

"Agora percebo..."

- Enquanto isso,
Um resto de luz
Tornava ainda visível
Aquela distância interna,
Na qual um outro tempo
Percorria de quando em vez
O espaço intransponível
Da minha curiosidade.



















"E o comboio?"

Reparem como ele pergunta pelo comboio...inconscientemente, recorda-se da infância...pobre poeta...é sem, dúvida alguma, uma perfeita criança.
















"Então?"

- O comboio?...

"Sim."

- Em sentido inverso ao tempo,
Seguia um outro rumo
Dento de mim...


"Compreendo perfeitamente."

- Ainda bem...

"Só não entendo a tua intenção..."

- É fácil!
Quero voltar a amar!...














"Está bem, está bem...
Mas porque motivo devo esquecer o comboio?"

- Essa imagem rídicula
Terá de ser anulada,
Tal como a criança em ti!...
O que é importante
É viveres o presente da narrativa.

"O que devo saber então?"

- Enquanto expus o que expus,
O que ficou no teu inconsciente?...

"Não sei!"

- Concentra-te!...

"Espera...é isso!...
Um resto de luz..."














- Meu caro:
Em quase tudo,
A luz é tudo...

"Porque não em tudo?"

- Porque não existe Tudo!...
Essa
É a razão, ainda,
Pela qual a Coisa não pára...














"Claro!
Esse ainda..."

- Ainda bem!...

"Mas, então como é?...
Tu próprio disseste
Que a luz é tudo!..."

- Neste caso
Luz é limite.
Ou seja:
Em certo prisma
A luz não evolui,
Caminha apenas no tempo...
Ou melhor:
No tempo do espaço,
E para não dizer o contrário,
Dir-te-ei:
A luz é o próprio tempo,
Na medida em que luz
É tempo iluminado.


















"O que queres dizer com
Um outro tempo?"

- O meu.
  
"É engraçado...
Para cá de outras coisas,
Sinto que há qualquer coisa...
Qualquer coisa de místico na luz!"

- Apenas a nossa compreensão
Está lá...
E quem sabe realmente?...
Contudo, agora
Falar-te-ei de outra luz...

"De qual?"

- Daquela que imobiliza
O sinal do silêncio
Do tempo humano…














"A que te referes?"

- À dos teus sonhos,
Aonde não existe tempo algum.

"Será que nos sonhos,
O silêncio vem da escuridão?"















- A qual silêncio fazes referência?...

"Ao dos sonhos!..."

- Aí não há silêncio!...

"Porquê?..."

- Não há razão para tal!...

"O silêncio está sempre
Do lado de cá?"

- Aí mesmo!...
E não será
Para que a luz tenha movimento...

 








"Não perguntei isso!"

- Antecipei-me à pergunta!...

"E para cá daí?..."

- Tudo é já em seu silêncio,
Ou muito antes da razão
Poder vir a ser
Alguma coisa mais...

"A razão evolui?..."

- Transformar-se-á!...

"Mas a Razão
,
A Moral e a Justiça
Não são valores eternos?..."

- Nunca foram!...
Já te respondi a isso:
Com o tempo
Tudo muda...














"E a eternidade?"

- É por enquanto contrária
À razão da razão...

"É pena..."

- Pois é!...
Começas a saber
Que o Homem só descobre
O que já existe
Em seu Nada autêntico,
Em seu mundo inventado...
Ou ainda: porque
Toda a semente humana
Terá dentro de si
Um outro Homem que não fala
E que não pode libertar-se...












"Porque não?..."

- É melhor pensar nisto mais tarde...

A viagem aproximava-se do destino, Ela esperava-me...e os meus receios, dúvidas e desejos aumentavam agora de intensidade. Por muito que eu tentasse controlar-me, a ansiedade escorria pelas minhas mãos, fazendo lembrar-me quão nervoso estava. De repente, a Coisa voltou apoderou-se de mim e segredou-me:

O teu tempo,
Por detrás
Daquilo que já conheces,
Circunda o espaço
Que forma cada coisa.
Enquanto que a noção de matéria
Será alterada, cada vez mais,
Pela insistência reflexiva
Ao alcance da distância.

Deveria haver nisto, ou para isto, uma referência a um outro tempo que não o meu. Referência a outras cores e ás formas da paisagem futura mas isto é ainda inconsciente. Essa insistência reflexiva e organizada subsiste para que a idéia de eternidade permaneça, ao mesmo tempo em que o Universo continuará a ser paralelo á transformação do seu humano ser. Quando dei por mim, tinha chegado...e o ponto de partida estava já reflectido no passado. Tudo aquilo, ou para aquilo, em que não pensei em meu próprio tempo estava ali, bem vivo ainda, em plena recordação naquela janela...


















"Esse «ainda»
É pura recordação!..."

- Que sabes tu?...
Esse «ainda»
Era mais do que para isso...
E no entanto
Era coisa aparentemente estática...

"O que se passou depois?..."

- Somente uma dúvida me assaltava...

"E qual?..."

- Aquela que provém dos sonhos
Ou sei lá de quê...

"Sim, mas qual!?..."














- Será que Ela vai gostar de mim?...

"E então!?..."

- Mais tarde
Conto-te os pormenores...

Súbitamente, uma voz trémula interrompera-me a reflexão:

 «Já é uma hora?»
«Já!» Disse eu.














Dizemos que sim a tudo quando queremos que nos deixem em paz.

(Dois temas: "MEMORIES" - Rosenberg Trio,
"The Journey Home" - Keith Jarrett)

foto de Daniela Rocha)

















* Esse dia estará para sempre cá dentro, minha linda Danishe...
Khanimambo, my love!

Pain-Killer