MIGUEL BAGANHA
exposição de fotografia
DESENROLANDO O ESCONDIMENTO
No tremendíssimo ruído do nosso tempo, a meio das tempestades, terramotos e guerras insanáveis, tudo parece emergir do fundo de nós, um medo, um desejo de pacificação. A fotografia é, entretanto, um extraordinário meio de registo, a imagem incandescente para a memória futura. Mas a sua temática plural, aberta à expressão das coisas e dos seres, não se retém nos rostos, rostos dementes, alienados, no limite: como no século XX, a fotografia está hoje ao dispor de trabalhos performativos quase insensatos ou à concentração de olhares em aprendizagem, que alcançam mobilidades concretas e conceptuais, seguindo, inclusive, a geometria do mundo, a vida e o uso dos materiais.
Essa pesquisa (se não se tratar de mero devaneio) corresponde a uma exacta disciplina do ver, da síntese dos grandes teatros de imagens. Como nos mostra Miguel Baganha, sempre mais interessado nas surpresas de coisas sem sentido, belas em si mesmas, campo apropriado ao grande interesse que o fotógrafo denota relativamente ao close-up, às esquinas que apagam as frontarias, aos nódulos da casca das árvores ou restos, novos indícios, das indústrias de transporte de líquidos, combustíveis, fontes desdobradas para uma hidratação em rede. Ele tanto pode interessar-se pela transformação das coisas, mudando a posição ou a óptica da câmara, como pode seguir caminhos onde qualquer registo se limita a rectângulos de pedra, fios de plantas meio mortas, terra marcada pelo rodado de alguns carros de tracção animal.
Aqui, e desta vez mais do que o close-up, desconstrutivo ou reconstrutivo, Miguel Baganha descola várias derivas pela colossal armazenagem de vários tipos de tubagem enrolada, atada, aqui e além, com um simples laço de corda, tubos de calibragens diferentes, estreitos e largos, duros e razoavelmente maleáveis, formando cilindros de acolhimento e manipulação do espaço. Por vezes, talvez muitas vezes, o registo abarca, apertadamente, o interior em túnel das arrumações ocas e a romper o limite do campo, revelando a textura da matéria ao lado de rolos mais desarrumados, porque flácidos, de tubos estreitos. O olho mágico do ver, aqui e além, desvenda a textura longilínea das paredes inorgânicas, enroladas pelo método da elipse contida, prontas a perder este afrontamento performativo — um dia desenrolando-se, fio condutor assente em valas rectas, a perder de vista, um dia sepultadas mesmo, borbulhando nos usos incontinentes. Registo de uma realidade perdendo-se, olhar pragmático para a distância dos gestos intimistas. Aqui, os montes de materiais são um testemunho dito e ambíguo da geometria onde a linha se apaga ou enrola para caminhos de muita longa distância.
série "Desenrolando o Escondimento"| 2011
Aqui, e desta vez mais do que o close-up, desconstrutivo ou reconstrutivo, Miguel Baganha descola várias derivas pela colossal armazenagem de vários tipos de tubagem enrolada, atada, aqui e além, com um simples laço de corda, tubos de calibragens diferentes, estreitos e largos, duros e razoavelmente maleáveis, formando cilindros de acolhimento e manipulação do espaço. Por vezes, talvez muitas vezes, o registo abarca, apertadamente, o interior em túnel das arrumações ocas e a romper o limite do campo, revelando a textura da matéria ao lado de rolos mais desarrumados, porque flácidos, de tubos estreitos. O olho mágico do ver, aqui e além, desvenda a textura longilínea das paredes inorgânicas, enroladas pelo método da elipse contida, prontas a perder este afrontamento performativo — um dia desenrolando-se, fio condutor assente em valas rectas, a perder de vista, um dia sepultadas mesmo, borbulhando nos usos incontinentes. Registo de uma realidade perdendo-se, olhar pragmático para a distância dos gestos intimistas. Aqui, os montes de materiais são um testemunho dito e ambíguo da geometria onde a linha se apaga ou enrola para caminhos de muita longa distância.
Rocha de Sousa
5 comments:
acho fantástico esse modo de expressão através das coisas simples e imperceptiveis a correria do dia a dia
=]
Caro End,
duma forma geral, encontro maior verdade nas coisas simples (ou escondidas) do que nas complexas (ou visíveis). Para isso, na linha reflectiva do que referi no último post, «é preciso cortar a afinidade com tudo» (ou o mais possível, até porque tal acto será sempre uma utopia e não passará de "força de expressão") e tentar encontrar a nossa verdade, escondida, para "cá" da aparência, para "cá" da "coisa em si".
Isto, entre uma panóplia de sentidos que os estetas atribuíram através dos tempos, é, para mim, (na voz de um *homem multidisciplinar) «Mobilidade Visual».
De resto, o Homem, de acordo com as leis mais profundas da existência humana, sempre procurou encontrar a sua "virtude", o seu "Imperativo Categórico". E ainda hoje, depois de tantas descobertas, o objectivo continua a ser o mesmo: transcendência.
Agradeço as visitas, End. Transcende-te!
Abraço =]
*Rocha de Sousa
Um beijinho especial amor meu :)
Vai dar tudo certo, acredita em mim.
Tens um belíssimo trabalho. Diferente que nos permite de facto viajar como diz a Maria João Franco, na companhia dos texto do Rocha de Sousa.
Parabéns.
Tenho ORGULHO em ti.
tua sempre, she
Por cada enrolamento dos tubos, me-
nos, mais,bocas abertas ao ver, a
percepção visual integra uma espé-
cie de desfocagem desconstrutiva, o
que indicia desenrolamentos incon-
tinentes e metamorfoses gráficas, esplendorosas, o visível abstracto e em sequência.
End tem razão (mesmo que nos marque
com um The End):as coisas são cor-
tadas cruamente e fluem para uma vertigem, uma espécie de ser ou não
ser. Silêncio. De súbito, um combo-
io apita numa passagem atroadora,
como se o mundo acabasse assim, en-
quadrado na beleza dos enquadramen-
tos.
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